Amigos leitores, amantes do automobilismo, eu tenho apenas vinte três anos e confesso: ainda adoro historias de super-heróis. Os novos, os antigos, os famosos, os inéditos, não importa, o ser humano adora a fantasia de um dia poder contar com super poderes. Porém, dentre as minhas pesquisas apuradas notei uma coisa em comum, quase 100% das pessoas com quem já comentei sobre esse assunto me diz “Eu não gosto do Superman”. E a explicação é simples, ninguém derrota o Superman, ele é invencível, ele não é humano, fica embaixo d’água o tempo que quiser, não sangra, não sente dor, não erra, pode sair da atmosfera da Terra, pode dar a volta ao mundo, já se deu ao luxo de voltar o tempo, pode subestimar seus adversários, mas que adversários? O Superman não têm adversários, ele esmaga a todos, tem supervelocidade, visão raio-X, audição superaguçada, ou seja, Superman é o defensor invencível, e só uma coisa o enfraquece, a Kriptonita, o que faz com que todos os seus episódios contem com isso, não há novidades, não há planos mirabolantes, todos sabem que em algum momento a pedra verde irá aparecer para dar uma chance aos vilões. O Superman é o herói ao contrário, é verdade, enquanto os heróis convencionais lutam contra vilões cada vez mais capacitados, desafiando as suas limitações naturais, Clark Kent é ilimitado, são os vilões que lutam para superar o herói que nunca perde. Por isso que, quando pergunto qual seu herói favorito, a maioria fala Batman, e o Batman não tem nem poderes, apenas parafernálias tecnológicas. Homem de Ferro, Quarteto Fantástico, Homem-Aranha, os X-Men, todos esses são heróis com poderes limitados e possuem um tendão de Aquiles. Os fãs buscam a superação, o sacrifício, o desafio.
O que quero dizer, amigos leitores, é que nas primeiras 5 temporadas da Fórmula 1 do novo milênio, o Superman deu as cartas, a bordo de uma Ferrari imbatível, um piloto que nunca errava, que vencia com uma, duas, três ou quatro paradas, o piloto que fazia poles, que vencia corridas em demasia e, mesmo que aparecessem alguns vilões, como Raikkonen, Montoya, ou até mesmo Barrichello, em uma corrida ou outra o super-herói deixava a Kriptonita aparecer e alterar o resultado. Schumacher foi gênio quando os gênios estavam em falta. A época de ouro da Fórmula 1, com Senna, Mansell, Piquet, Prost, encerrou-se em 1994, com um desfecho deveras conhecido. Sobrou Schumacher, que perdeu as batalhas para Adrian Newey, em um carro Ferrari que demorou anos para se desenvolver até que pudesse entrar diretamente pela briga do título. É verdade que Michael Schumacher teve vilões um tanto quanto abaixo da média, Damon Hill, Jacques Villeneuve e Mika Hakkinen sempre foram questionados sobre suas capacidades. E quando Schumacher acertou a mão, aí vieram os cinco títulos mundiais e uma superioridade avassaladora.
Mas, como disse no título dessa coluna, ninguém gosta do Superman, ele é forte demais, não deixa brechas para os adversários, quando perde, perde para ele mesmo. É bem verdade. E é comprovável.
Até o final de 2004, quando Michael Schumacher foi heptacampeão, ninguém mais agüentava a mesmice que virou a Fórmula 1. Aos nossos domingos pela manhã, Rubens Barrichello não ousava ultrapassá-lo, e, quando ousava, a “Liga da Justiça” fazia com o mesmo abrisse passagem, os adversários poderiam até tentar se unir, mas como vencer um inimigo que não é deste planeta? As apostas não tinham mais graça, o interessante nos “bolões” que por aí se estendiam, era para saber quem completaria o pódio, ninguém gosta do herói invencível e previsível que se tornou Michael Schumacher. Ele era antipático, arrogante e sua soberba era visível. Ninguém gostava do alemão que humilhava seus adversários. A Fórmula 1 era de Schumacher.
E em 2005 a Kriptonita foi descoberta. A Ferrari errou a mão, por culpa dos fracos pneus Bridgestone e ascensão da Michelin, que fez uma parceria vitoriosa com a Renault, e a McLaren correndo por fora. Há muitos anos a Fórmula 1 viu Michael Schumacher fora da briga do título, o herói invencível havia enfraquecido. Mas com a perda de suas habilidades, Schumacher ganhou, talvez, a única coisa que lhe faltava, a simpatia do torcedor. Pela primeira vez em anos nós vimos um Schumacher que erra, que sai da pista, que balança o carro, que busca o limite para alcançar seus adversários, que perde, que briga, que vence de forma heróica. Quem não se lembra de sua última corrida saindo do último lugar após um pneu furado no GP Brasil de 2006? A ultrapassagem magnífica em Kimi Raikkonen nas voltas finais. Pouca gente se lembra da corrida administrativa de Fernando Alonso que venceu o campeonato. Todos se lembram da vitória de Felipe Massa, e da corrida endemoninhada do alemão, que mesmo maduro, corria como um garoto que fazia sua estréia e precisava mostrar serviço. O Schumacher de 2005 e 2006 não foi vencedor, pelo menos não de corridas e títulos, mas ganhou muito, ganhou carisma, fazia sacrifícios em busca da vitória, buscava o limite do carro e vencia ou perdia de forma heróica. Ganhava suas cicatrizes, pois elas que carimbam o passaporte de um bom herói.
Em 2006, o herói enfraquecido via um vilão em ascensão, Fernando Alonso poderia bem ser o Lex Luthor tão temido que conseguia ter em mãos a Kriptonita e assim, se aproveitar para conseguir vencer. Logicamente que é apenas uma alusão ao tema, Alonso é um dos pilotos mais corretos do grid, é um piloto completo e vencedor, o bicampeão mais jovem da Fórmula 1 não merece ser lembrado pela sua arrogância, mas sim pelos fatos, porém, teria de ser assim com Schumacher, e não é.
Schumacher aprendeu a se divertir e entreter o espetáculo. Sua torcida foi enorme na luta contra o espanhol, perdeu, mas perdeu com o sorriso de quem conquistou realmente tudo o que poderia conquistar, títulos, vitórias, poles, recordes, a imprensa, a crítica, o público.
Em 2007 e 2008 nós vimos algo que não conseguíamos ver nos anos anteriores, vimos quatro pilotos de personalidades tão diferentes brigando pelo título. Você poderia escolher o arrogante Alonso, o novato de carisma marcante, Hamilton, o frio e calculista, Raikkonen ou o latino, Massa. Em 2008 as opções quase se repetem e o campeonato fica imprevisível, pois sem o Superman, os heróis limitados mostram seus erros, mostram suas deficiências. Novos heróis, como Kubica, surgem, pois conseguem se sobressair sobre os já carimbados.
Portanto, caros leitores, gostaria de dizer que o Superman é chato, não tem graça ver algo que você sabe como vai acabar, que você sabe o desfecho, sem emoções ou expectativas. A Fórmula 1 pós-Schumacher é excepcional em termos de emoção e eu acho errado que falem que tudo isso é nivelar por baixo, Schumacher, sim, era acima da média. Os pilotos atuais como Hamilton, Raikkonen e Alonso, são excepcionais, Schumacher era genial, seu trabalho começou há 10 anos na Ferrari, é uma década de desenvolvimento e aperfeiçoamento, foram quatro anos sem título de pilotos, mesmo brigando pelo mundial, um trabalho a longo prazo em um time estruturado. Alonso fez o mesmo na Renault, mas não fez na McLaren, como Raikkonen e Massa pegaram o time pronto na Ferrari. Schumacher e sua trupe reorganizaram uma equipe que possuía um orçamento fabuloso e fizeram acontecer. O espírito de liderança, aliado há um segundo piloto fenomenal e uma equipe técnica que contava com os melhores profissionais fizeram a época de ouro da Ferrari. Prost e Senna dividiram títulos e brigas em 1990, Schumacher foi mais egoísta, não deixando brechas para Irvine ou Barrichello, era uma equipe milionária totalmente voltada para o trabalho de um piloto. Enfim, os telespectadores, torcedores, patrocinadores e a imprensa, gostam de ver o espetáculo, as brigas e disputas, e o Superman não deixa com que isso aconteça, porque ele é muito forte, ou seja, nada disso irá acontecer, por isso, meus amigos, todos preferem o Batman, por isso, meus amigos, que ninguém gosta do Superman.
Iceman®2008